O papel da empatia dentro daquilo que queremos criar e as diferenças como vantagem competitiva. Vamos ouvir para projetar?

Neste texto aqui, falei sobre os princípios do design universal e em como aplicá-los a produtos e projetos digitais.
Logo depois, comecei a revirar meus cadernos atrás das anotações que eu havia feito em algum momento durante as aulas de Design Universal. Levou algum tempo, mas encontrei o que procurava. Os registros resumiam a diferença entre três paradigmas: excludente, integrativo e inclusivo. Estas três palavrinhas são bastante usadas em estudos sobre educação, mas por que não relacioná-las ao design, ao desenvolvimento de interfaces e a projetos digitais? Então vamos lá!
O paradigma excludente
Acho que uma boa forma de ilustrá-lo são as cenas iniciais do filme “300”. Se bem me recordo, existia um ritual de jogar crianças de um penhasco de um penhasco, caso elas não atingissem a perfeição desejada para se tornar um guerreiro espartano.
Claro, que na vida real, não é bem assim que acontece. Podemos falar, por exemplo, de elevadores sem braille nos botões ou de sites e aplicativos sem nenhum recurso de acessibilidade.
Por tanto, o paradigma excludente, é baseado na exclusão total de pessoas que não se adequam ao que é visto como “normal” dentro de uma cultura, de um povo ou sociedade. Cabe ressaltar que não necessariamente essa exclusão tem que estar associada a algum tipo de execução, como no exemplo acima. Pode ser algo mais sutil, como privar alguém de conviver em sociedade por causa de suas limitações físicas ou de uma doença. Enfim, características que estigmatizam aquele indivíduo como estranho, inferior.
O paradigma Integrativo
O paradigma integrativo, por sua vez, integra o indivíduo que se diferencia dos padrões — culturais, físicos ou outros — considerados “normais” pela sociedade, mas de forma assistencial. Sendo assim, anula as capacidades e aptidões do sujeito em questão, tratando-o como diferente e limitado. Esse princípio nasce com o conceito de humanidade e formação de uma consciência sobre os aspectos coletivos da sociedade.
Há escolas que separam os alunos com algum tipo de síndrome dos demais. Apesar destes alunos terem um suporte exclusivo para eles, são privados da convivência com os outros colegas, o que causa um certo tipo de segregação e, sutilmente, reforça o ideia deles serem menos capazes que os demais.
É comum que algumas atitudes integrativas façam parte do dia-a-dia, quando existe um esforço para ter uma atitude empática perante àqueles que são considerados diferentes. Porém, nem sempre elas são efetivas. Como, por exemplo, a imagem abaixo:
Poderíamos dizer que com essa rampa entre a escada, todos teriam como acessar a casa. Mas, só de olhar, já percebemos que essa solução não foi bem desenhada. O mesmo ocorre em projetos digitais quando são propostas somente algumas funções para facilitar o uso por pessoas com necessidades específicas. Será que não seria mais fácil projetar de forma mais abrangente, que facilite o uso de todos os usuários?
O paradigma inclusivo: projete para todos!
Designer: lembre-se sempre sobre o papel da empatia no processo de design. Escutar o outro e entender qual a maneira que aquele indivíduo deseja ser tratado, conhecer e reconhecer suas aptidões e habilidades desenvolvidas durante a vida para viver da melhor forma possível. Assim, a inclusão ocorrerá de maneira verdadeira.
O paradigma inclusivo trata da valorização da diversidade e propõe o reconhecimento dessas diferenças/deficiências como uma vantagem competitiva/aptidão, frente aos demais indivíduos.
Neste contexto, mais do que em qualquer outro, a empatia é essencial. Saber ouvir seus usuários, absorver o que for necessário e desenhar os projetos de acordo com os feedbacks recolhidos pode gerar um baita resultado legal e trazer a tona várias ideias e percepções de mundo diferentes. O que, com certeza, tornará seu projeto mais rico e relevante.
Pausa para uma curiosidade: desde o ano de 2012 os jurados responsáveis pela análise das baterias das escolas de samba em São Paulo são deficientes visuais. A ausência da visão faz com que os outros sentidos sejam mais aguçados, por isso conseguem analisar de forma mais refinada a cadência e o ritmo do samba. Fonte:https://istoe.com.br/190374_O+CARNAVAL+DA+INCLUSAO/
Ok, mas como podemos garantir o bom uso nossos produtos digitais por todos? Além dos Princípios do Design Universal, existem algumas diretrizes que nos auxiliam a desenhar telas e sistemas realmente acessíveis. Existem, inclusive, normas e regulamentações desenvolvidas por organizações mundiais, como a World Wide Web (W3C).
Um dos materiais que mais gosto de consultar quando desenho algo é o material.io, desenvolvido pelo Google. Lá é possível achar diversas diretrizes e boas práticas para criação de aplicativos e sites. Também existe uma parte dedicada somente para os pontos de acessibilidade, que resumirei em outro artigo.
A empatia e o design
Designer: lembre-se sempre sobre o papel da empatia no processo de design. Escutar o outro e entender qual a maneira que aquele indivíduo deseja ser tratado, conhecer e reconhecer suas aptidões e habilidades desenvolvidas durante a vida para viver da melhor forma possível. Assim, a inclusão ocorrerá de maneira verdadeira.
É necessário entender que todos os indivíduos têm suas limitações e suas aptidões. Alguns são bons em matemática, outros em português. Existem os que têm ouvido musical e aqueles que estudam anos a fio para chegar o mais perto possível da nota perfeita. Os que não ouvem, usam os olhos como ninguém e os que não enxergam usam do tato e da audição para perceber o mundo ao seu redor.
Não devemos esquecer que todos estão aptos para conquistar tudo o que desejarem e devem ser tratados com respeito, empatia e dedicação, pois somente aquele indivíduo sabe o peso das batalhas diárias que enfrenta.
Como diz Caetano Veloso em sua canção “Dom de Iludir”: “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”.
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